Resguardou-se de mim o início que a tecla nega a firmar e, ao
contrario de Drummond, não sei do seu paradeiro, nem sinto “inundar”
o momento. Se a voz leve me falta, faço uso do tom pesado doutro que
está, injustamente, às margens, para apresentar quem merece a
presença:
“A literatura de um povo é o desenvolvimento do que
ele tem de mais sublime nas idéias, de mais filosófico no
pensamento, de mais heróico na moral e de mais belo na natureza; é
o quadro animado de suas virtudes e de suas paixões, o despertador
de sua glória e o reflexo progressivo de sua inteligência.”
Gonçalves de Magalhães / Discurso sobre a Historia da Literatura do
Brasil
Ermado Leitor, o espírito progressista e a alma de um povo codificam
o âmago dessa poesia. O Silêncio da crítica
esteve, no correr dos anos, a gerar o que configuraria-se no mito.
Rosalía de Castro transcendeu à figura histórica e literária
tornando-se um simbolo cósmico, uma corporificação do espirito
galego.
Nascida em Santiago de Compostela a 24 de Fevereiro de 1837, Rosalía
recebe, na sua juventude, formação em Musica, Artes e Literatura;
torna-se parte das atividades do Liceo de la Juventud, ponto de
encontro dos intelectuais provincialista - perpassou todo o correr de
sua obra as influencia socialistas e o ideário republicano
assimilado neste período de sua vida. Mudou-se para Madri em 1856, casando-se dois anos depois com Manuel Murguía, então investigador, cronista e
jornalista. Nasce sua primeira filha, Alejandra, em 1859, quando o
casal retorna para Galícia. Em 1861, novamente em Madri, publica
seus primeiros escritos em galego e castelhano. Durante o tempo que
se seguiria até seus quarenta e oito anos quando morre de cancro (1837), daria a luz à Aura, nascida em Dezembro de 1868; Gala e
Ovídio, gêmeos, nascidos em Julho de 1871; Amara, nascida em Julho
de 1873; Adriano Honorato Alejandro, nascido em Março de 1875 e
Valentina, nascida morta em Fevereiro de 1877.
Pioneira no uso do galego em categoria literária e adotando a
língua não oficial - castelhano - para a grande maioria de seus
escritos, a poetisa transforma-se em um atrativo para o esquecimento que mais
tarde séria de profundo inconveniente para a crítica. Ignorando a
origem comum separa-se, ainda hoje, sua produção galega da
castelhana como se não fossem nutridas da mesma força vital.
Situada entre o lírico e o social, se bem cabe a ilusão desta
fronteira, no espelho vivo de cada verso não só a poetisa se
reflete, mas também todo seu povo. Deixo, para deleite, dois poemas
do original em galego, notará o Leitor a semelhança.
I - VAGUEDÁS
I
Daquelas
que cantan as pombas i as
frores,
todos
din que teñen alma de muller.
Pois
eu que n'as canto, Virxe da Paloma,
ai!,
de qué a teréi?
II
Bem sei que non hai
nada
Novo en baixo do ceo,
Que antes outros
pensaron
As cousas que ora eu
penso.
E bem, ¿para que
escribo?
E bem, porque así
semos,
Relox que repetimos